Ler Caminhando sobre às águas – Capítulo 38 Online

— Vou fazer a edição.

Glenn McQueen disse, estendendo a mão para Jack Black, Taylor e Liam enquanto eles retiravam os cartões de memória de dentro das câmeras. Jack arregalou os olhos e olhou para McQueen, então escondeu o cartão de memória no punho, e o colocou na frente do peito. Vendo Jack balançar a cabeça desesperadamente em negação, McQueen estreitou as sobrancelhas.

— Me dê isso.

— Não.

— Jen.

— Como você pode fazer isso comigo!

— Jennifer.

— Você não pode fazer isso.

— Pare de brincar comigo.

— Você vê meu desespero como uma piada?

— …Me dê isto.

Jack Black tremeu ao observar Glenn McQueen suspirar e baixar o tom de voz.

— Tudo bem, vou dar para você, mas não é porque estou com medo.

Ele cobriu os olhos com uma das mãos e relutantemente estendeu o cartão de memória com a outra. Jack, que abriu os olhos e olhou através da fresta dos dedos entreabertos, soltou um gemido doloroso enquanto observava McQueen levar o cartão de memória. Se foi isso que Janine quis dizer sobre o lado fofo de Jack, eu poderia concordar um pouco com ela.

— Então me dê o original.

Jack acrescentou corajosamente e cruzou os braços, tentando negociar tanto quanto possível.

Enquanto esperava o momento de voltar para casa, assisti a dramática encenação junto com Janine. Se o gênero se tornasse uma piada, Jack Black seria o único culpado, mas Glenn McQueen também costumava ser influenciado por ele até certo ponto, enquanto fingia ignorá-lo.

Baixei a cabeça enquanto refletia sobre a história da amizade dos dois que começou pouco depois da faculdade. Olhei para os tênis que estava usando. Balancei meus pés dentro dos sapatos secos.

As memórias que vieram foram inevitáveis. Lembrei-me dos sapatos Converse que estavam bem secos na sapateira naquele dia. Se Janine é como uma cor primária brilhante, McQueen é uma cor acromática sem saturação. A gentileza inesperada que ele ocasionalmente demonstra é branca e totalmente sem calor, e a figura que está absorta em pensamentos é turva e negra com intenções desconhecidas.

Era uma definição arbitrária, que lembrava as roupas acromáticas que ele gostava de usar e o mosaico preto e branco na parede de sua sala, mas de alguma forma acho que isso combina com ele.

Dois sapatos baixos com estampa de leopardo surgiram na frente dos tênis Converse desbotados em meu campo de visão estreito. Quando eu olhei para cima, vi Janine, usando óculos escuros com estampa de leopardo, estava com o cabelo loiro preso atrás das orelhas.

— Vamos lá. Você esperou muito tempo?

— Na verdade não.

Com os braços cruzados e com a ponta do pé levemente levantada, Janine sorriu com uma cara agradável. Quando me levantei, senti um peso, como se tivesse uma bola de ferro no meu estômago. Eu engoli um pequeno gemido com a dor que subiu pela minha espinha.

— Você está bem?

— Huh. Acho que estou exagerando.

— Não acho que você esteja exagerando.

— Certo.

Eu a deixei para trás e andei na ponta dos pés, então disse para os homens que estavam conversando sobre a edição.

— Eu já vou.

— Oh tudo bem. Obrigado pelo seu trabalho.

Acenei com a cabeça para Taylor, e então me virei para Glenn McQueen. Não sei quantas vezes estarei filmando pornografia no futuro, mas me perguntei quantas vezes mais iria cumprimentá-lo dessa forma. Olhando para seus lábios, curvei a cabeça brevemente e me virei. Disse que estava tudo bem, mas minhas pernas tremiam como se eu tivesse descido uma montanha.

— Ugh, eu não posso, Janine!

— O que foi?

— Estou me sentindo muito culpado agora.

— O quê?

Jack Black disse a Janine, que perguntou de novo com indiferença.

— Lancer, esse bastardo foi muito bruto. Você não vê as pernas dele tremendo? Ele não podia ter feito isso com a nova estrela em ascensão na indústria.

A mão de Jack Black se voltou para minha direção. Jack apontou para mim enquanto me chamava de estrela em ascensão e disse.

— Leve-o de carro.

— Eu não trouxe meu carro…

— Está tudo bem. Vamos.

Segurei o pulso de Janine e abaixei a cabeça mais uma vez para cumprimentá-los. A expressão “estrela em ascensão” que Jack usou para se referir a mim e a perda de força em minhas pernas, apenas por ter sido penetrado pelo pênis de um homem como uma mulher, eram ridículas. A situação em que fui repentinamente tratado como uma pessoa com mobilidade limitada só porque havia feito sexo era engraçada, e minha condição, que me obrigava a aceitar sua consideração, era patética. Quando puxei o braço de Janine com uma expressão rígida no rosto, ela me seguiu sem dizer uma palavra.

— Espere um momento. Vou buscar a chave no quinto andar.

Quando olhei para trás, Glenn McQueen estava segurando o braço de Janine.

— Eu vou buscar o carro, então posso te levar para casa.

Movendo seu olhar para mim, ele gentilmente agarrou o braço de Janine. Janine colocou uma expressão difícil no rosto já que estava sendo puxada de ambos os lados. McQueen puxou o braço de Janine um pouco mais e disse.

— Então vamos.

Dessa vez parecia haver calor em sua atitude bondosa. Eu olhei para ele e segurei firme o pulso de Janine.

— Tudo bem. Vou te levar para casa, basta esperar eu pegar o carro.

A mão de Janine que havia sido pega por mim escapou do meu agarre.

— Vai ser mais rápido se você for de carro. O que você acha? Nós te devemos isso.

Ela sorriu e deu um tapinha nas minhas costas com a mão. Como se ser educado por algo insignificante fosse o que pedia a etiqueta. Ela assumiu o trabalho tedioso, mas Glenn McQueen nem se importou. Afinal, se sua gentileza era calorosa ou não, o que isso importa? Todo mundo estava olhando para mim. Eu era o único que estava frustrado com essa decisão trivial. Então, eventualmente, acenei com a cabeça.

Quando abri a porta do banco traseiro, ele acenou com a mão e disse.

— Espere um minuto.

McQueen tirou um cigarro do bolso da frente da camisa, colocou-o na boca e abriu a porta do passageiro. Ele pegou um monte de papel que se amontoava no painel do banco da frente e uma caixa no banco do passageiro, então os moveu para o banco traseiro. O interior do carro estava bagunçado e desorganizado, diferente de toda a organização que eu tinha visto antes.

Sentei-me no banco do passageiro e coloquei o cinto de segurança, observei o homem entrar no carro e ligar a ignição. Pouco antes de sair, ele apertou o isqueiro para acender o cigarro.

— Você fuma?

— Sim.

— Você quer de um?

Quando eu assenti a cabeça, ele tirou um maço de cigarros do bolso da frente de sua camisa. Eram da marca Carmel. É um pouco tóxico, mas tenho o mesmo gosto por cigarros.

Quando aceitei, ele me deu um, e então acendeu o isqueiro e colocou na ponta do cigarro, em seguida pegou os óculos de sol no painel do carro e abaixou o quebra-sol por causa do longo pôr do sol alaranjado.

— Mostre-me o caminho. Eu fui lá à noite, mas não me lembro.

O carro saiu pela rua de mão única. Quando a fumaça do cigarro se acumulou no interior do carro ele abriu a janela. O vento estava quente e abafado. Só depois de virar à esquerda no cruzamento e pegar a ponte Queensboro, a velocidade aumentou e o vento esfriou.

Ele não ligou o rádio e também não tivemos uma conversa casual. Olhei para o perfil do homem, inclinei minha cabeça contra a janela e olhei para a ponte de aço vertiginosa. Já fazia muito tempo que eu não cruzava a ponte Queensboro durante o dia, já que ultimamente estava viajando entre Queens e Manhattan de metrô, há um bom tempo eu não usava meu carro que estava prestes a virar sucata. A ponte era coberta por armações de aço tingidos de carmesim e marfim, o que dificultava a vista da cidade. Apaguei o cigarro, esfregando a ponta do filtro em um cinzeiro que estava no painel do carro.

O pôr do sol começou a cair sobre a ponte. O céu dourado estava deslumbrante. Olhei para o último raio avermelhado do sol poente com os olhos entreabertos.

Ele passou os dedos nos fios de cabelos que foram soprados pelo vento e ligou o rádio. A música fluía dos alto-falantes, sem que soubéssemos o título.

Eu balancei um pouco a cabeça com a batida da música e estendi a mão para uma pasta grossa no painel que estava me incomodando a um tempo.

— Posso ver?

Ele virou a cabeça. Olhou para frente novamente, e então assentiu.

— Não me importo.

Era um script rabiscado em letras cursivas, o canto do bloco de papéis tinha sido grampeado. Ele havia sido escrito com pressa, por isso a escrita era difícil de ler e o papel estava parcialmente rasgado, impossibilitando a leitura do conteúdo. A história parecia se tratar de cenário onde surgiam robôs, havia uma narrativa do tipo (Eiro, falou em tom indiferente enquanto mexia nas próprias pernas).

Eiro: Agora estou sofrendo de muitas preocupações. Nesse ritmo, meu coração vai explodir.

Lara: Não se preocupe com palavras abstratas inúteis as quais você não precisa, seu idiota. Você deve se preocupar com o óleo saindo de seu corpo. Parece o dobro de um ano atrás.

Lara, aumentou a velocidade em que polia a peça à mão para fazer os pregos de ferro brilharem.

Eu olhei para o papel e olhei para a face lateral de McQueen.

— Foi você quem escreveu?!

Com minhas palavras assertivas, os olhos de McQueen se voltaram para o script em minhas mãos. Em vez de responder, ele sorriu e acenou com a cabeça.

— Quando você escreveu isso?

— Quando eu estava no ensino médio. É sobre robôs que têm habilidade de amar, é infantil.

— Não acho que seja infantil.

Balançando a cabeça, ele abaixou um pouco o volume da música do rádio.

— Eiro deve ser o personagem principal.

Assentindo, ele disse:

— O personagem principal é um robô estúpido que passa a vida pensando em palavras abstratas.

Eu olhei para o seu rosto e virei a página rasgada. Pensei nas palavras abstratas de Eiro, que ele disse ter criado quando estava no ensino médio. Palavras conceituais que variam dependendo da interpretação e são definidas de forma diferente para cada pessoa. Esperança e desespero, raiva e alegria, fé e simpatia, vazio e amor.

Os CDs e papéis empilhados no banco de trás também são registros que contém seus pensamentos pessoais? Olhando para o banco de trás pelo espelho retrovisor, virei as páginas do script. Mesmo enquanto olhava para o roteiro que escreveu quando era jovem, ele dirigia silenciosamente, sem mostrar qualquer sinal de vergonha ou preocupação.

Quando olhei para cima depois de observar as páginas por muito tempo, estávamos no início de Chinatown. Eu disse enquanto olhava para a placa da lavanderia de longe.

— Eu tenho que parar na lavanderia. Eu vou a pé a partir daqui.

— Vá. Eu vou ficar esperando por você.

Agradeci a ele enquanto ele estacionava cuidadosamente o carro e fui até a lavanderia para pegar o terno que precisava usar de manhã. Ele estava sem os óculos escuros, quando voltei e me sentei no banco do passageiro, abraçando as roupas que cheiravam a tecido tingido.

— Ser guarda-costas vale a pena?

— Sim.

— Não é perigoso?

— Na verdade não.

— Devo virar à esquerda na loja de eletrônicos?

McQueen, que olhava alternadamente para o lugar e a estrada, apontou com a mão para fora da janela.

— Sim. Você pode virar ali e ir em frente. Ou você pode me deixar na frente da loja de eletrônicos. É mais conveniente parar o carro lá.

— Havia uma loja de conveniência perto da sua casa, e eu vou deixar você lá. Tenho que comprar cigarros de qualquer maneira.

Sentado no banco do passageiro eu folheei o roteiro novamente. Parecia improvável que McQueen usasse uma temática tão cômica para contar uma história. Podia sentir seu olhar enquanto eu lia a parte em que Eiro gritou por causa do óleo que estava vazando da borda de seu peito devido à sobrecarga de preocupações.

O olhar indiferente de McQueen alcançou o script em meu colo. No momento em que olhei dentro daqueles olhos, pensei que talvez todos esses registros fossem apenas excrementos de emoções que já haviam esfriado, nada mais do que o passado para Glenn McQueen.

— Chegamos.

Depois de parar o carro, soltou o cinto de segurança e saiu do carro comigo. Nós já havíamos nos despedido, mas o segui até a loja de conveniência. Também pedi camel light junto com ele, cocei a bochecha de vergonha e peguei camel no balcão.

— Temos o mesmo gosto para cigarros.

Ele sorriu brevemente e olhou nos meus olhos. Tirando dinheiro da carteira, ele disse ao funcionário que ia pagar pelos dois maços de cigarro. Então peguei o cigarro que ele havia comprado para mim.

— Vou fumar um pouco.

Ele balançou a cabeça secamente, tirou o plástico do cigarro e o enfiou no bolso da frente da camisa. Tirou a chave do carro da calça, abriu a porta e saiu da loja de conveniência. Enquanto abria a porta, ele disse.

— Entre e descanse.

— Ah, sim.

— Mas…

Endireitei minha cintura latejante e olhei diretamente para ele da calçada.

— Não é nada em especial, no entanto.

— …

— Por hoje… Desligue seu celular.

Glenn McQueen murmurou como se estivesse brincando. Perdi o momento certo de rir junto com o homem. Olhamos nos olhos um do outro em silêncio por um tempo. Naquele breve momento, o tempo parecia ter um valor distante da realidade.

Do que você está falando? Sem pensar duas vezes, ele deu um passo para trás e se virou para abrir a porta do carro.

Quando ele se virou eu repentinamente pensei em beijar as costas do homem.

Eu sou louco. Minha testa formigou como se eu tivesse levado uma marretada na cabeça. Todo o meu rosto estava franzido enquanto falava comigo mesmo. Não sei se ele olhou para mim, que estava parado na calçada como um estúpido, do espelho retrovisor do carro que partiu rapidamente a soprando poeira.

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continua….