Ler Caminhando sobre às águas – Capítulo 60 Online

Com uma bufada, Chang olhou para Yo-wi, que estava olhando para ele com uma expressão de raiva, suspirando pesadamente, depois baixou a cabeça novamente e enfiou a carne na boca.

Chang olhou em volta com um certo desprezo, como se sentar aqui e perder um tempo jogando conversa fora não fosse nada interessante. Chang lançou seu olhar para mim e disse com uma expressão estranha.

— Você ludibriou essa criança?

— Não.

— Xue Jingyi disse que Yo-wi só fala sobre você hoje em dia.

— Eu? Quando eu fiz isso?

— Ele só fala sobre você. Especialmente quando se trata de assuntos relacionados à dívida.

— Eu só falo sobre isso de vez em quando, não faço isso com tanta frequência!

Yo-wi, que levantou a cabeça e corou, olhou nos meus olhos e franziu a testa. A maneira como suas orelhas ficaram vermelhas eram como se estivesse dizendo que estavam cientes da minha presença.

— Eu estava me perguntando se você estava tentando persuadir Yowi.

A maneira como Chang falou como se eu tivesse poluído a mente Yo-wi, fez eu me sentir desconfortável, então larguei a colher rudemente.

Enquanto limpava os óculos com a gravata, ele abaixou a cabeça e ergueu os olhos. Os olhos compridos com cílios longos, e com pouca gordura nas pálpebras, eram frios e sem nenhum vislumbre de sorriso. Assim ele me oprimia todas as vezes mesmo sem qualquer razão. Os olhos se estreitaram como se estivesse me repreendendo.

— Nós não nos encontramos recentemente. Yo-wi veio me ver apenas uma vez, mas eu o mandei para casa rapidamente.

— Sério?

— Sim.

Como eu estava lidando com pessoas com quem eu não queria estar, não consegui terminar nem metade da minha comida, perdi totalmente o apetite. Tirei um cigarro do bolso da frente e sai da sala. Coloquei o cigarro na boca que estava amarga, como se os sucos gástricos emergissem, mas senti que seria desrespeitoso fumar em uma casa para a qual eu não tinha me mudado ainda, então coloquei de volta no bolso. O papel de parede parecia úmido. Resmunguei para mim mesmo, tão baixo que ninguém escutou.

Puxei a cama que estava presa na parede, que eu não havia verificado antes, para o chão. A cama de parede, que é usada principalmente para aproveitamento de espaço, fez um som de rangido quando puxada. Quando olhei para ela, a superfície que tocava o chão era irregular.

Me deitei na cama, que fez um barulho alto de rangido como se estivesse prestes a desmoronar. Embora os sintomas do resfriado tivessem desaparecido, cansava-me facilmente por causa da súbita perda de peso. Ao olhar para o teto, notei coisas nas quais não havia prestado atenção. O teto tinha manchas amareladas por toda parte, provavelmente porque a pessoa que vivia aqui no passado havia fumado muito no quarto.

— Eu não conseguiria usar uma cama flutuante como essa, isso me deixaria nervoso.

Chang sentou-se na cama. O som das molas batendo umas nas outras era tão alto que se tornava irritante.

— Eu não vou trazer ninguém para dormir comigo, então está tudo bem.

Chang que estava deitado ao meu lado franziu a testa e sorriu ao sentir o cheiro do tapete de viseira deitado ao lado dele.

— Quando foi a última vez que você teve uma namorada?

— Nove meses atrás.

— Deve estar enferrujado lá embaixo.

Quando virei a cabeça, Chang estava bem ao meu lado, olhando para mim. Com um sorriso seco, ele lambeu o lábio inferior ressecado como se estivesse sedento, então ele mordiscou a caneta macia com os dentes. Quando ele esfregou os dentes nas células brancas de pele morta, o sangue se infiltrou e seus lábios ficaram vermelhos. Virei a cabeça porque me senti desconfortável com o hálito quente de Chang me atingindo.

— Não é desse jeito.

— Ah, então você deu uma lubrificada nele?

— Sim.

— Que tipo de mulher ela é?

— É só que…  eu não me lembro bem, estive com ela apenas uma vez.

Na verdade, era um homem, não uma mulher, mas não havia necessidade de dizer a ele.

— Você foi a um clube ou algo assim?

— É parecido.

— Deve ter sido trabalhoso.

— Foi um pouco.

— Em outras palavras, é complicado passar por esse processo para dormir com uma mulher.

Virei a cabeça para Chang que estava sorrindo.

— Então o que você faz?

— Eu gasto dinheiro.

— …

— Sim.

— Porque as mulheres que pagamos para fazer isso não são exigentes.

Seu cabelo, que havia sido cuidadosamente penteado com pomada de cabelo para que a franja não caísse sobre a testa, e seu rosto impecável, parecia de alguma forma estar cheio de algum tipo de prazer indescritível. O olhar em seu rosto me lembrou de suas palavras de antes, quando ele disse que gostava deste país que é duro com os pobres. Ele parecia capaz de ser grosseiro com as mulheres na cama sem hesitação.

— O quê? Você vai fazer aqui?

Quando virei minha cabeça para a voz desconhecida, pude ver um rosto saindo pela fresta da porta aberta. Era Ryan Tessler. Achei que ele poderia ter saído porque a porta estava trancada, mas ele estava de pijama. Ele estava encostando o ombro na porta, pressionando a mão contra o cabelo bagunçado.

— Fazer o quê?

Chang, que meio que ergueu as costas, olhou para Ryan e eu alternadamente.

— Não é isso que vocês iam fazer agora? A cama está rangendo. Não é a prova de som, então eu vim aqui para impedi-los.

— O que você quer dizer com isso?

— Vocês dois não iam transar?

— Transar?

Chang olhou para mim quando ouviu isso do estranho que tinha aparecido de repente, com o rosto franzido.

— Quem é essa criança?

— Eu? Sou a pessoa com quem ele vai dividir o apartamento.

Olhando para Ryan que respondeu secamente, Chang se levantou e sacudiu suas roupas com as mãos como se estivesse limpando a poeira. Chang olhou de cima a baixo para Ryan com uma expressão altiva no rosto e disse com um sorriso.

— Você é gay? Você tem uma imaginação fértil para essas coisas.

Ryan, que há muito tempo olhava para Chang em tom sarcástico, virou-se para mim. Seus olhos se arregalaram um pouco e sua voz estava lenta como se sua língua estivesse paralisada.

— Quem é esse babaca?

— Ele veio me ajudar com o papel de parede…

— Hm… acho que seria melhor não trazer esse tipo de cara para casa novamente no futuro. Ah, tudo bem. Não é da minha conta.

Ryan se interrompeu e coçou o cabelo, que estava bagunçado como palha. Ele olhou para o papel de parede no saco de papel que eu havia colocado no canto do quarto.

— É melhor pintar, isso é horrível para colocar.

Então ele se inclinou na direção da sala de estar. Ele estava acariciando seu estômago lentamente, como se estivesse com fome.

— O que você comprou? Acordei por causa do cheiro bom de comida. Sobrou alguma coisa?

— Coloquei na estante da sala. Eu também comprei para Cecil.

— Meu bebê está dormindo agora.

Ryan se aproximou da estante, colocou um cigarro na ponta dos lábios e vasculhou o saco de papel. Seu rosto que estava sonolento se acendeu quando ele verificou o conteúdo do recipiente de plástico.

— Posso comer?

— Sim.

Ele largou o cigarro que estava mordendo com os dentes na prateleira e sentou-se ao lado de Yo-wi. Yo-wi ficou olhando para Ryan com um rosto confuso por um longo tempo enquanto apertava o garfo. Ao desempacotar o pacote, ele olhou para Yo-wi com um olhar tenaz.

— Você é irmão de Tommy?

—  O quê?

— Você é irmão mais novo dele?

Apontando para mim com um garfo, Ryan perguntou sarcasticamente. O nome Tommy era estranho, mas Yo-wi não parecia se importar. Yo-wi, que estava olhando para Ryan sem expressão e lambendo os lábios, balançou a cabeça rapidamente.

— Ah… não, não.

— Por que você está me olhando assim? Você me conhece?

— O quê? Não! Eu não sei.

Yo-wi rapidamente desviou do olhar de afiado de Ryan. Chang, que tinha acabado de sair do quarto, disse a Yo-wi.

— O que você tem a dizer?

— O quê?

— Já são oito horas. Você está arrastando isso, o que diabos você quer dizer? Você que tinha algo para dizer, fale de uma vez.

Chang pressionou Yo-wi, que não disse uma palavra, como se sua boca ainda estivesse presa.

— Você tem algo a dizer?

— Não é grande coisa.

— Não é grande coisa?

— É apenas uma bobagem.

— Você passou o dia inteiro ontem me infernizando para trazê-lo até ele, e agora que estou aqui diz que não é grande coisa?

— Sim.

Em resposta a pergunta curta do garoto que ele cortou com uma única faca, Chang colocou as palmas da mão nas têmporas e fechou os olhos. Os músculos de sua mandíbula, que estavam tensos de tanto cerrar os dentes, se contraiam.

— Eu já vi o rosto dele, então vamos embora.

— O quê?

— Chang, vamos embora?

— Ir embora?

— Pegue as chaves do seu carro.

— Eu não vou embora enquanto você não falar o que tem a dizer. Diga!

— Foda-se, não é nada, então por que você continua me incomodando!

Yo-wi gritou de repente e jogou o garfo que segurava no chão. Não era ameaçador porque era de plástico, mas ficou preso verticalmente na tigela de isopor que Yo-wi estava comendo. Enquanto estava olhando para Ryan, que levantou a cabeça com uma cara atônita, Yo-wi pulou da cadeira.